A importância da qualidade da água para evitar problemas nos laboratórios
A água é um dos bem mais preciosos para a humanidade, como todos nós bem sabemos. Mas, sempre que ouvimos ou dizemos isso, o que vem em nossa mente é o consumo do dia a dia, água para beber, cozinhar, para nossa higiene diária. Mas, além de ser extremamente necessária em nossas casas, há um outro lugar onde a água também é essencial e utilizada amplamente, estamos falando dos laboratórios clínicos, farmacêuticos e de pesquisas.
A água é um importante reagente, mas mesmo assim costuma ter sua qualidade meio que deixada de lado. Ela é o suprimento de menor custo de todos os que são utilizados nos laboratórios, e deve ser por esse motivo que sua qualidade seja tão negligenciada.
Em nossas casas, não bebemos a água que ‘vem direto’ da torneira, porque a consideramos imprópria para esse consumo, primeiro ela passa por um processo de filtragem e só depois a consumimos, quando finalmente a consideramos pura.
Para o uso nos laboratórios a água também precisa estar “PURA”, mas vale ressaltar que o conceito de “água pura” não será o mesmo em todas as situações.
Por exemplo, a água que é considerada pura para o uso doméstico é aquela livre de microrganismos patogênicos e agentes tóxicos. Agora, a água utilizada nos laboratórios é considerada um reagente químico, portanto é tida como água pura quando nela contém uma quantidade mínima de contaminantes (íons, matéria orgânica e microrganismos) porque assim poderá atender a diferentes situações. Você sabia que traços de íons ou metais podem tanto acelerar como também inibir várias reações? Na água que é oferecida para o consumo da população, há cerca de 1,0 mg/L de cloro (que pode oxidar os reagentes e prejudicar os resultados dos exames), se essa água for utilizada nos laboratórios causará interferência em vários procedimentos com bacteriologia e enzimologia, além de poder causar na determinação dos cloretos erros de até 25%. A dimensão do erro gerado pela impureza da água depende bastante do analito (uma substância ou componente químico, em uma amostra, que é alvo de análise em um ensaio) nela concentrado. Portanto, a água deve ser purificada para que seja utilizada nos laboratórios, a fim de não produzir interferências nos testes ou ensaios. Durante a purificação devem ser eliminadas todas as substâncias dissolvidas e suspensas na água.
Vale ressaltar que nos laboratórios a água precisa ser purificada para todos os processos de análise. Mas, cada processo requer um nível de purificação. A variedade de pureza da água nesses locais precisa variar de pura a ultrapura, de acordo com as necessidades de aplicações como a biologia molecular, fotometria, reconstituição de reagentes, diluições, soluções padrões, preparação de soluções de enxague e de tampões, cultura de células, alimentação de analisadores automatizados, cromatografia e histologia.
Processos de purificação da água
Agora vamos conhecer alguns processos de purificação e qual a função de cada um deles.
Destilação – é um processo de separação de misturas homogêneas que se baseia na diferença de pontos de ebulição entre os componentes, ou seja, quando temos duas ou mais substâncias formando uma mistura líquida. Assim é possível utilizar novamente os componentes da mistura.
Deionização – geralmente é realizada em colunas de troca iônica. Essas colunas contêm microesferas que em contato com a água liberam íons de hidrogênio (H+) (resina catiônica) e hidroxilas (H-) (resina aniônica) ligados de forma instável, pelos íons mais altamente carregados presentes na água como o íon cálcio (Ca2+), íon magnésio (Mg2+) que se unem com mais firmeza às resinas. O resultado é a remoção dos cátions e ânions dissociados na água. No caso das resinas de troca catiônica, esta trocará seus íons hidrogênios (H+) por contaminantes catiônicos, como cálcio, magnésio, ferro, alumínio, manganês, cobre, zinco, cromo, níquel e outros cátions metálicos e cátions diversos. As resinas aniônicas por sua vez trocam seus íons hidroxilas (OH-) pelo contaminantes aniônicos, como clorato, clorito, cloreto, sulfato, sulfito, sulfeto, nitrato, nitrito, fosfato, fluoreto e outros ânions, além da sílica.
Osmose Reversa – se trata de um tipo de filtração especial que força a água a passar por uma membrana fina e semipermeável que age como um filtro molecular, devido ao fato dessa membrana possuir poros suficientemente pequenos para a passagem da água pura e rejeitar moléculas maiores, como os sais dissolvidos (íons) e também outras impurezas minúsculas como as bactérias, por exemplo. A membrana remove de 90 a 99% das impurezas da água. Devido a sua capacidade de remoção de bactérias e pirogênios (produtos do metabolismo de organismos, como bactérias e fungos, que podem causar febre), a osmose reversa é frequentemente combinada com a deionização de modo a reduzir a frequência de regeneração das resinas de troca iônica.
Filtração por Carvão Ativado – se trata de uma esponja porosa, sólida e preta, que permite a passagem de líquidos ou gases, para que esses interajam com o carbono exposto. A função do carbono é a de absorver uma ampla gama de impurezas e contaminantes, incluindo cloro, odores e pigmentos. Em geral, se coloca o filtro de carvão ativado nos sistemas de purificação de água antes da osmose reversa e antes da deionização.
Ultrafiltração – utiliza uma membrana com poros ligeiramente maiores que os da membrana de osmose reversa. Nesse processo de filtração a pressão hidrostática (pressão que ocorre no interior dos líquidos, sendo exercida pelo peso do próprio líquido) força um líquido contra uma membrana semipermeável, assim essa fina camada de material é capaz de separar substâncias devido a essa força motriz que está sendo aplicada.
Nanofiltração – se trata do processo de separação por membranas, capaz de remover determinados sais, parte dos compostos orgânicos e partículas com peso molecular no range de 300 a 1000 daltons. É o tratamento de água com pressão que separa os íons e os elementos solúveis na água.
Exemplos de membranas filtrantes usadas em osmose reversa, nanofiltração e ultrafiltração.
Eletrodeonização – esse processo utiliza a eletricidade, é uma tecnologia combinada de resinas e membranas de seleção iônica com corrente contínua. Pode ser utilizada como alternativa aos cartuchos de purificação de uso único.
Classificação da água
A água é classificada. E, o mercado costuma utilizar normas ISO, ASTM ou NCCLS (National Committee for Clinical Laboratory Standards), enquadrando a água em graus 1, 2 e 3, ou tipos 1, 2, 3 e 4.
Como a norma ISO 3696 é amplamente utilizada, vejamos como fica essa classificação.
Água grau 1 - é considerada a de mais alta pureza, livre de coloides iônicos ou dissolvidos e de contaminantes orgânicos, apropriada para as técnicas analíticas mais sensíveis, incluindo a cromatografia líquida, espectrometria de emissão por plasma, cromatógrafo iônico, biologia molecular e eletroquímica.
Água grau 2 – essa água conta com níveis reduzidos de contaminantes orgânicos, inorgânicos e coloides, por isso é indicada para métodos analíticos como a espectrofotometria de absorção atômica e a análise de traços. Uma múltipla destilação, a deionização ou a osmose reversa e a destilação podem produzir esse tipo de água de laboratório.
Água grau 3 – esse grau tem uso em grande parte das aplicações laboratoriais na química úmida e no preparo de reagentes e soluções. A produção dessa água pode ser por destilação simples, osmose reversa ou deionização por troca iônica.
Com o desenvolvimento dos equipamentos analíticos, recentemente gerou-se uma nova classificação de água nos laboratórios, a tipo 1+, essa é considerada a frente das exigências da água grau 1. A necessidade do tipo 1+, veio principalmente de especificações de alta sensibilidade de espectrômetros de massas com plasma indutivamente acoplado (ICP-MS), de técnicas de biologia molecular (DNAse e RNAse) e de análises de ultratraços. Se trata de análises para níveis baixíssimos de detecção, em partes por bilhão (ppb) e partes por trilhão (ppt), com detectores de massa de alta sensibilidade. E, por isso a água precisa ser praticamente isenta de contaminantes.
Para se obter uma água de alta qualidade, é preciso sempre avaliar a necessidade, as vantagens e as desvantagens de cada método. Vejamos a tabela abaixo:
Tab1
Como vimos, a água considerada “pura” pode variar de acordo com as necessidades para o seu uso. E, vimos também vários processos para se chegar ao nível de “pureza” esperado dessa água, sempre de acordo com o uso que a ela será destinado. Vimos ainda conforme a norma ISSO 3696 os 3 graus de classificação da água. Tendo esses cuidados, os laboratórios poderão evitar erros em suas análises e ensaios, pois como vimos a água é um suprimento amplamente utilizado e o de menor custo nesses locais.